Olá,
foi lançado hoje o novo relatório semestral do Instituto Fogo Cruzado, com dados de violência armada de 57 municípios, das regiões metropolitanas de Rio de Janeiro, Recife, Salvador e Belém. Os indicadores apontam tendências importantes que precisam ser consideradas para o planejamento das políticas públicas de segurança no país. O ano de 2025 já está marcado por um aumento nas disputas entre grupos armados e também pela violência contra crianças e adolescentes.
O jovem Guilherme César Sales de Queiroz, 18 anos, e o adolescente Ronildo Fábio da Silva Ribeiro,15 anos, foram mortos a tiros, na noite do dia 29 de junho, em Olinda, no Grande Recife. Os dois estavam acompanhados de amigos quando homens chegaram atirando. No mesmo dia, no Alto do Cabrito, em Salvador, na Bahia, aconteceu algo parecido. Alef Santos Alves e Alex Nepomuceno dos Santos, ambos de 19 anos, foram mortos a tiros. Eles também estavam com amigos num 'paredão' quando homens passaram de carro atirando contra centenas de pessoas. A dupla, que trabalhava no comércio da região, morreu na hora, e outras nove pessoas ficaram feridas.
As disputas se intensificaram em Pernambuco, na Bahia e fizeram vítimas na juventude. No Rio de Janeiro, não foi diferente. Em 5 de maio, no Complexo da Pedreira, na Zona Norte do Rio, Michel Oliveira Fortes foi morto durante um tiroteio entre homens de facções rivais. Cinco dias antes, o barbeiro Fábio Oliveira Fortes, de 25 anos, foi morto numa localidade conhecida como Terra Nostra, em Barros Filho. Ele foi atingido por uma bala perdida durante confronto entre grupos rivais, quando chegava ao trabalho. Michel e Flávio eram irmãos.
Se puxarmos esse fio, posso contar a história de 172 pessoas baleadas neste primeiro semestre de 2025 durante disputas. Vinte e uma vítimas eram crianças e adolescentes. Vinte pessoas foram vítimas de balas perdidas. O número de tiroteios em disputas cresceu 36% e o de baleados 23%. Se considerarmos apenas crianças e adolescentes o aumento é de 91%.
Na região metropolitana do Rio de Janeiro, 154 tiroteios em disputas foram registrados no primeiro semestre, resultando em 47 mortos e 25 feridos. O aumento de 48% em relação ao mesmo período do ano anterior evidencia que a estratégia de enfrentamento baseada no confronto falha em conter a violência. As áreas que concentram mais confrontos no Rio de Janeiro estão em disputa desde 2024. Catiri, Complexo do Fubá, Morro dos Macacos e Complexo do Juramento concentram 57% dos tiroteios em confrontos entre grupos armados do Grande Rio. Há meses a população convive com tiroteios intensos entre facções e entre elas e as milícias.
No Grande Recife, foram registrados 18 tiroteios em disputas, com 16 mortos e 11 feridos, nos primeiros seis meses do ano. Ano passado, registramos somente um tiroteio em disputas no semestre.
Na capital baiana e região metropolitana, a situação não é diferente. Foram 81 registros de tiroteios motivados por disputas pelo controle territorial. Embora o número de tiroteios seja igual ao do ano passado, o número de mortos foi de 35 para 45. Fica claro que a estratégia das forças de segurança, conhecidas por sua alta letalidade, não gera os resultados esperados.
Apenas na região metropolitana de Belém, onde o Fogo Cruzado atua há menos tempo, não foram registrados tiroteios motivados por disputas territoriais no período. Mas isso não significa ausência de violência. Entre janeiro e junho a região registrou quase dois tiroteios por dia, totalizando 292 registros. Desses, 48% aconteceram durante ações ou operações policiais. Uma única comunidade quilombola foi palco de três desses confrontos, três pessoas foram baleadas no local.
A violência armada não dá trégua e a ação dos grupos armados se complexifica ano a ano. Do outro lado, vemos quase que uma total ausência de políticas públicas e ideias que possam dar conta de uma realidade ao mesmo tempo cruel e intricada.
A recente Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da Segurança Pública até gerou expectativas sobre mudanças estruturais no cenário nacional, mas a verdade é que não traz respostas para os desafios que os dados apontam. As disputas territoriais armadas não aparecem na proposta do governo federal que também não indica como pretende lidar com o tráfico de drogas e o sistema prisional — área relevante para encararmos o tema das facções.
Os dados estão disponíveis. As evidências são claras. A população paga o preço e aponta a segurança pública como sua principal preocupação. Por quanto tempo mais os governos federal e estaduais negarão esta realidade?
Você pode acessar os relatórios semestrais das quatro regiões metropolitanas no site do Fogo Cruzado.
Comentários
Postar um comentário